sexta-feira, 20 de julho de 2012

Um brinde à amizade!

"Amizade é um amor que nunca acaba" (Mario Quintana)

Como é bom ter amigos, não é? 

Ter aquele(s) parceiro(s) que tanto acalenta(m) as dores em momentos difíceis quanto transforma(m) situações que poderiam passar despercebidas em instantes únicos e inesquecíveis.

Michel Foucault
(15/10/1926 - 25/06/1984)
O filósofo francês Michel Foucault via na amizade uma forma de reinventar a vida e superar criativamente as relações de dominação entre as pessoas.

Com efeito, em tempos de crise, amigos possuem um enorme potencial para diminuir efeitos do estresse, melhorar o humor e auto-estima, bem como favorecer em estratégias de resolução de problemas.

Além do mais, rotineiramente são divulgados estudos demonstrando o quanto vínculos de amizade estão atrelados à saúde, bem-estar e prolongamento da vida.

ENFIM... NADA COMO UM BOM AMIGO, NÃO É???

Em contraponto, presenciamos atualmente um tempo cujo convite à solidão e individualismo estão incrivelmente mais atraentes. O livro é de AUTO-AJUDA, o restaurante é SELF-SERVICE, e por aí se vai numa infinidade de outros exemplos que reforçam mais e mais a ideia estadunidense de SELF-MADE MAN!

Porém, longe de estar criticando os benefícios deste modo de vida (que contribuem muito em aspectos como a autonomia, inclusive) reconhece-se também o quanto a sociedade vem se modificando bastante, a ponto de se reelaborar formas de pensar o que é família, repaginar os modos de convívio social e do quanto os laços de amizade contribuem para um relacionamento amoroso mais saudável.

FRIENDS, série cuja trama se desenrolava em torno de um grupo de amigos que, desastres a parte, forneciam um ótimo apoio social nas dificuldades dos componentes do grupo.

Trazendo a conversa pro campo da etologia, estudos com primatas demonstram que a maioria deles também costumam se organizar em grupos, com mais de três adultos.

Na maioria das espécies animais, em situações de conflito, quem vence é o maior, mais forte ou o que possui algum atributo físico que lhe forneça vantagem na batalha.

Em contrapartida, primatas contam não só com seus atributos físicos, como também com suas estratégias sociais. No caso, há um maior investimento, por parte dos primatas, na construção de alianças, favorecendo que membros, com porte físico inferior ao adversário, possam triunfar (haja vista o auxílio dos aliados presentes).

Um outro componente importante, vincula-se a questão de que indivíduos com mais habilidades para a formação e manutenção de alianças, costumam ter também maior sucesso reprodutivo.

Estas informações fornecem interessantes pistas para um rastreamento do nosso passado ancestral, no que diz respeito a amizade e organização social. Haja vista os registros fósseis indicando que a vida em comunidade já era uma realidade para nossos ancestrais. 

A formação de vínculos grupais para o auxílio na caça e proteção, pode requerer um cérebro com capacidades de prever o comportamento alheio e, também, contribuir para que o próprio comportamento não seja previsível (olha o início do comportamento de malandragem aí! HAHAHA).

Dado o fato de que ficar sozinho e longe do acampamento poderia refletir em um grande risco, uma vez que a estrutura física da maioria dos primatas, inclusive a nossa, não seja lá grande coisa, sugere-se que todos nós (Homo-sapiens) sejamos descendentes, primordialmente, daqueles que sabiam trabalhar em grupo (haja vista o baixo sucesso reprodutivo dos que optavam por ficarem sozinhos).

Este raciocínio ganha mais força quando registros fósseis denunciam o fato da expansão do cérebro coincidir com a época em que, o gênero Homo, passou a habitar predominantemente campos abertos e construir ferramentas. 

Neste ponto é válido ressaltar o quanto a capacidade de produzir instrumentos de auxílio (ferramentas) incide em um alto grau de desenvolvimento cerebral, levando-se em conta que para produzir uma ferramenta, faz-se necessário que se tenha capacidades de planejamentos e raciocínios a longo prazo, para que se possa projetar um material que seja eficaz.

ALTRUÍSMO RECÍPROCO vs EMPATIA

Em 1971, Robert Trivers postulou uma controversa teoria, da qual ele chamou de "Altruísmo recíproco". Segundo ele, os animais, longe de serem solidários e cooperativos, agem de modo egoísta e os custos dos favores prestados devem ser recompensados.

No reino animal como um todo, existem cooperações com não-parentes, porém elas acontecem mediante pagamentos imediatos. Já no caso dos seres humanos, por terem passado por esse histórico ancestral (destacados anteriormente), o desenvolvimento de funções cognitivas mais refinadas permite que haja uma maior negociação a longo prazo, havendo a possibilidade de que o favor seja pago mais pro futuro.

Esta capacidade do ser humano, permite-o lembrar e avaliar aqueles que merecem continuar recebendo favores. Para os que não retribuem, acontece um processo cujo relacionamento sofre uma ruptura (deixa-se de oferecer benefícios ao trapaceiro).

Em oposição a esta ideia, Frans de Waal acredita na capacidade de solidariedade dos animais, sobretudo na dos humanos, mediadas pela capacidade empática. Conforme já comentei aqui (em um post sobre empatia), é possível encontrar casos de pessoas que chegam a arriscar a própria vida para salvar a de outros, ou então de pessoas doando anonimamente utensílios ou dinheiro, para pessoas que não conhece e que provavelmente não terá nenhum outro contato no futuro. Condições estas que tornam a hipótese do "altruísmo recíproco" insustentáveis. Além do mais, Frans de Waal já encontrou exemplos de solidariedade, altruísmo, senso de justiça e cooperação em outros primatas, elefantes e golfinhos.

Assim, para entender como a amizade foi possível, atribui-se a possibilidade de ser uma espécie de sub-produto da evolução da cooperação entre indivíduos da mesma família.

Falando de outra maneira, aceleradas modificações no ambiente podem ter sido rápidas a ponto de que nossos comportamentos não conseguiram tempo suficiente para se adaptarQuando os comportamentos de amizade foram se estabelecendo, ao longo da evolução, as comunidades mal possuíam 100 pessoas, sendo grande parte destas, aparentados.

Para isto, lembremos que parentes (familiares) possuem nossos genes, então é maior a probabilidade de providenciarmos benefícios a estes. As sociedades foram crescendo, crescendo, crescendo, até que começou a dificultar na identificação de quem era parente ou não. Os indivíduos não parentes, de certa maneira passaram a substituir os familiares.

Agora, soma-se a isso, nossa capacidade de empatia. Pronto... chegamos ao que conhecemos hoje por essa forma de relação, que aconteceu meio que por acidente, mas que mesmo assim é tão boa.

FELIZ DIA DO AMIGO!!!

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Para esse post foram consultados textos dos livros:
- "O gene egoísta" (Autor: Richard Dawkins)
"Fundamentos de Psicologia: Psicologia Evolucionista" (Organizado por: Emma Otta e Maria Emilia Yamamoto)
- "A era da empatia: lições da natureza para uma sociedade mais gentil" (Autor: Frans de Waal)

quarta-feira, 18 de julho de 2012

...mas eu me mordo de ciúmes!

Nos anos 80, um dos grandes hits da época era a música "Ciúme". Nela, a banda Ultraje a Rigor, além de praticamente descrever os principais comportamentos de alguém altamente ciumento, explora - com bom humor - a dificuldade enfrentada por um rapaz em adaptar-se às novas condições da época em que vive (mesmo com todo o incentivo que recebe de sua parceira afetiva).

Para aqueles que não estão lembrando qual é a música (ma oeee!), gostam dela ou, por incrível que pareça,
 ainda não conhecem-na, segue a versão acústica dela:


Pois bem... 
Essa necessidade em levar uma vida moderninha (como descreve a letra) é uma discussão recorrente em novelas, livros e filmes.

Babila Teixeira Marcos, de 24 anos.
Morta a facadas pelo marido. Segundo
familiares: "ele era muito ciumento".
Na literatura, "Otelo" (de William Shakespeare) e "Dom Casmurro" (de Machado de Assis), são duas obras clássicas que abordam o conteúdo do ciúme, explorando o mais tênue dos sentimentos inerentes a esta condição. 

Na vida real, cotidianamente ficamos sabendo de situações de ciúme, que vão desde uma leve insegurança até trágicos incidentes que veiculam pela mídia, sendo o mais recente,
o caso do esquartejamento do diretor executivo da Yoki.

Em maior ou menor proporção, TODOS nós experienciamos um certo ciúme. Para tanto o auto-controle torna-se quesito totalmente pertinente para que casos de pequenas inseguranças pessoais não se tornem um outro assunto em pauta nas páginas policias de jornais.

Por definição, podemos entender que o ciúme seria uma reação negativa ao envolvimento do seu parceiro com outra pessoa. Este envolvimento pode ser sexual ou afetivo, pode ser real ou imaginado


C
omo base nos levantamentos feitos acima, é possível observar como o ciúme é um assunto bastante atrelado ao sofrimento e pode contribuir para danos à própria espécie, sendo motivo desencadeador de rupturas amorosas e, até mesmo, de homicídios (como visto acima). No entanto, alguns especialistas no assunto, como o psicólogo evolucionista David Buss, por exemplo, apontam para a direção do ciúme ser uma característica importante para a nossa espécie, haja vista sua implicação no ambiente de adaptação evolutiva.


A LÓGICA EVOLUCIONISTA
Ao aplicar o raciocínio evolucionista, devemos nos lembrar que uma de suas lógicas repercute no indivíduo atuando de modo que favoreça a propagação de seus genes. 

R
eproduzir e investir na prole ofertando cuidados e demais subsídios para sua sobrevivência, são questões que demandam gastos energéticos aos cuidadores, no entanto, ela viabiliza que seus sucessores possam ter uma vida saudável e passe adiante os genes.


Destes gastos, os custos e benefícios passam a entrar em cena, favorecendo um investimento diferencial entre machos e fêmeas, predeterminando a maneira como tais irão se comportar um em relação ao outro.



IMPORTANTE: Investimentos nos filhos, necessidade de reproduzir-se e demais comportamentos que evoquem condições como estas, não implicam necessariamente em uma intencionalidade consciente. São expressões finais de um longo processo de seleção natural, que favorecem que um organismo se comporte de determinada maneira.

Ainda que cada espécie possua sua peculiaridade, em grande parte dos mamíferos a gestação é feminina.
Para ela, os custos biológicos na formação do filho refletem em demandas quanto a cuidados no período de gestação, haja vista algumas restrições proporcionadas por este momento.
No ambiente ancestral, força física e acúmulo de recursos
poderiam ser dados como características fundamentais de
um bom cuidador, haja vista seu vigor físico para a busca do
alimento e seus acúmulos para períodos de escassez.

No caso dos humanos
, as mulheres passam por um período de 9 meses de gestação, SENDO PASSÍVEL DE OCORRÊNCIA nos últimos 3 meses algumas condições como falta de ar, desconfortos, inchaços nas extremidades... Enfim, condições que demandam cuidado e atenção de outrem! 


Para tanto, em relacionamentos
a mulher tende a procurar um parceiro que potencialmente possa oferecer para ela, e posteriormente aos filhos, recursos e cuidados para a manutenção de uma vida saudável para todos.


Enquanto uma mulher só pode ter um ou dois (em casos extremos até seis, sete ou oito) filhos a cada 9 meses, um homem pode produzir muito mais que esta quantidade de filhos em apenas uma noite (difícil, mas possível)!

Deste modo, a preocupação masculina vincula-se mais à sua exibição e competição, no intento de cativar o maior número possível de garotas que possam passar seus genes adiante.


ENTRETANTO...


Criar filhos demandam custos, por isso, é compreensível que os cuidadores deem preferências para ofertar cuidados aos próprios filhos (questões como a adoção é um outro caso que pretendo debater em um outro post). Neste ponto, a mulher sempre terá 100% de certeza quanto sua maternidade... mas e o homem também?!?
Na obra "Dom Casmurro", Bentinho vive o sofrimento do ciúme,
e reforça a possibilidade de uma traição de Capitu (sua esposa)
ao observar aspectos do filho do casal, que teriam a ver com
Escobar, um grande amigo de Bentinho.

Pois é... esta incerteza quanto a paternidade é uma condição que assola a parte masculina. Deste modo, seu ciúme possui raízes sexuais, ou seja, teme que sua mulher tenha relações sexuais com outro parceiro
.


Em contrapartida, a parte feminina pode ficar insegura quanto as relações afetivas do seu parceiro, haja vista a possibilidade deste em optar por disponibilizar os recursos, que outrora eram dedicados a ela, para uma outra mulher (e por recursos entende-se não só materiais, mas também aspectos afetivos: carinho e atenção, por exemplo)!!!

Esta ponderação apresenta que homens e mulheres tendem a manifestar ciúmes sob diferentes condições. Pensando nisso, David Buss postula uma teoria que diferencia dois tipos diferentes de ciúmes:
o emocional (predominantemente feminino) e o sexual (predominantemente masculino).


Um post que se aprofunda mais nesse estudo
realizado por David Buss, pode ser encontrado
no blog 
Científica Mente (vale a pena conferir)


Para compreender isso melhor, Buss fez um levantamento com estudantes universitários, que demonstrou em seus resultados a predominância masculina de manifestação do ciúmes em situações de traição sexual, e a predominância feminina em sentir-se ameaçadas quando confrontadas com acontecimentos que remete seu parceiro envolvido emocionalmente com outra.


Este estudo foi replicado por diferentes pesquisadores em diferentes culturas, em que pode ser identificado uma influência cultural nas manifestações do ciúme, no entanto, as taxas de predominância mantinham-se como homens relatando mais ciúmes sexuais e mulheres apontando os ciúmes emocionais como elemento perturbador.

Por fim, constatar a influência cultural no ciúme, demonstra que ele está sujeito a aprendizagens e que não é uma condição imutável do nosso organismo. Temos sim a predisposição para... Não significa que devemos manter isso! Podemos aprender com ele, controlá-lo e modificar nosso modo de interpretar determinadas situações e adequar-se aos novos paradigmas que cada sociedade vive.






*Gostaria de agradecer a Helen Mezoni, pelas dicas na formulação do texto. Obrigado!

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Para esse post foram consultados textos dos livros:
"Fundamentos de Psicologia: Psicologia Evolucionista" (Organizado por: Emma Otta e Maria Emilia Yamamoto)

- "A paixão perigosa: por que o ciúme é tão necessário quanto o amor e o sexo" (Autor: David Buss)

segunda-feira, 2 de julho de 2012

"Comer tudinho, pra ficar fortinho"!!

Zapeando pela internet, eis que encontro, no blog fonteCOM, o ótimo quadrinho:


Aos que conhecem a Mafalda (personagem do quadrinho), sabem que o tipo de humor dela é justamente utilizar da inocência infantil para refletir os valores sociais. 

Entretanto, o que me chamou a atenção no quadrinho acima, foi demonstrar ela brava com a imprensa, ao ver sua mãe encontrar uma receita de um prato que ela não gosta.
Já diz o ditado: primeiro
come-se com os olhos
!!!

Indo além disso, o que a Mafalda revela, trata-se de algo importante a ser refletido: este tipo de comportamento de rejeição a determinados alimentos é comum.

Todo mundo já deve ter passado pela experiência de apenas ver ou sentir o cheiro de uma comida e, logo em seguida, desistir de comê-la.


Esta rejeição, trata-se de uma espécie de desconfiança acerca do que está prestes a ser ingerido.

Comportamento esse que, por sua vez, n
ambiente de adaptação evolutiva, pode ter se revelado como uma forma eficiente de reduzir os riscos de estar comendo algo tóxico. 

O quê!?!? COMO ASSIM???
Hoje em dia (boa parte da população) pode se dar ao luxo de comer até mesmo não tendo fome. Porém, no ambiente ancestral, nossos antepassados possivelmente enfrentavam largos períodos de escassez de alimentos.

Entretanto, ainda com muita fome, não dava para sair comendo de tudo o que se via pela frente. 

Na dura competição selvagem, todos os animais e plantas desenvolveram ao longo de sua história evolutiva, algum tipo de defesa: comportamentais, mecânicas ou químicas.
Tais defesas foram sendo desenvolvidas com a finalidade de que isto possa contribuir com sua sobrevivência (uma vez que evita-se sua predação).

Com efeito, por conta do estilo de vida nômade, certamente inúmeros animais e/ou vegetais desconhecidos eram constantemente encontrados por nossos antepassados. Estes, por sua vez, tinham de ser minuciosamente analisados antes de serem ingeridos, haja vista a possibilidade de serem venenosos ou algo do gênero.

Tanto o aspecto visual quanto o cheiro do alimento foram fiéis aliados na escolha do que chegaria à boca ou não.
Assim, as predisposições genéticas para as escolhas alimentares atuais ganham mais sustentação, tendo em vista que preferimos mais os alimentos salgados e doces em detrimento dos amargos e azedos.

Associa-se a esse fato, a condição de que a dieta ancestral era composta por frutos, folhas e grãos (o consumo de carne entraria anos mais tarde, entre 10 a 40 mil atrás), enquanto os alimentos amargos sugerem uma presença de toxinas nocivas.

Contudo, à medida que cada pessoa vai se familiarizando mais e mais com o alimento, o comportamento de rejeição vai diminuindo seu aparecimento (tomamos, hoje em dia, remédios com péssimos gostos, porém, por sabermos que ele irá contribuir com alguma demanda, vamos aos poucos diminuindo a relutância em tomá-los).

Esta familiarização permitiu que, ao longo do tempo, nossa culinária se refinasse cada vez mais, a ponto de... bem...


...enfim!!! Acabei de me dar conta de que preciso me alimentar: alguém me acompanha?


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Para esse post foram consultados textos dos livros e artigos:
"Fundamentos de Psicologia: Psicologia Evolucionista" (Organizado por: Emma Otta e Maria Emilia Yamamoto)